vou guardar de meu o arrastar das tuas sandálias, o barulho da chave na mesa, aqueles suspiros cansados de mais um dia. vou lembrar dos teus braços largando o remédio na mesa, na periferia da minha visão, enquanto eu continuava afundado naquela solidão que até a mim já tinha cansado. vou ouvir o bater da porta do armário da cozinha, vou lembrar do frio de quando você abria a porta da geladeira, daquele arranhar dos teus dentes na maçã. vou me odiar por cada dia que até aí ainda não tinha te dito oi, e me odiar mais ainda por abusar da tua boa vontade, quando tu sorrias com aquela alegria de todo dia, com aquela vontade de continuar não desistindo de algo que eu não compreendia, e que só fui capaz de reconhecer hoje, quando não ouve arrastar-barulho-suspiro-remédio-armário-geladeira-maçã-alegria-insistência. foi embora o que de mais humano me permiti ter.